quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Sempre, enfim


Pertenço a lugar nenhum, fora de mim. Vou-me embora sempre. Minha religião é o amor. Sou devota das vontades, que me devoram a alma e me inquietam o espírito. Sou pagã de mim mesma, pertenço ao mundo. Qual mundo. O que me conduz são os desejos, que são e deixam de ser. A incógnita, o vazio preenchido por qualquer coisa que não seja o mesmo. Gosto de gente, das gentes, da gente. Dos sonhos e dos desejos que não me pertencem, mas falam de mim. Flerto com as possibilidades, converso com o acaso, procuro uma rima, um ritmo, qualquer coisa. Qualquer coisa que não seja isso que vem pronto, entregue e digerível. Gosto das possibilidades. Converso com o impossível. Danço com o que não conheço, escrevo sobre o que não sei. Pertenço a nenhum lugar. Sou ar, sou vento, sou asas. Do tédio renasço, reinvento. Me mato e ressuscito. Sou de lugar qualquer. Dos dias que viram noite, das noites que não acabam, dos dias que terminam, das madrugadas que calam. Pertenço a coisa qualquer, não me acho, coisa nenhuma. Me transporto pra qualquer lugar, dentro ou fora de mim. Sou asas, sou ar, sou vento. Intenso que sopra pra dentro. Pertenço a lugar nenhum, vou-me embora sempre. Reinvento sonhos, invento histórias, conto histórias para mim mesma. Ouço, aceito, digo em voz alta, acredito, desacredito. Flerto com meus desejos, desiludo-me com o acaso, visto luto para o impossível, desisto, resisto e vou-me embora. Sempre. Vou-me embora, enfim.

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Justificativas

Até hoje, decisões tomadas, sem razões claras. Quiçá, motivações pontuais. 
Nem sempre houve análises profundas, prós e contras. 
Houve escolhas. A princípio, impensadas. 
Aquela intuição, algo dizendo que devia ser assim. Então vamos. 
Decidimos primeiro, pensamos depois. Ou nem pensamos. 
Um belo dia, entre o gole de cerveja e a abocanhada no espetinho, algo se torna claro. 
Uma explicação com a coerência digna de um planejador. 
Que chata a vida de quem calcula tanto. 
Tão mais revelador é num dia desses, despretensiosamente, chegar a alguma conclusão.
Qual foi? Sabe-se lá. 
Foi-se com a espuma da cerveja ou com a fumaça da churrasqueira.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Um espelho

No fim, o que resta, são as lembranças dos dias.
Dos medos. Alguns um tanto infantis e outros justificados por sentimentos de auto-preservação.
Das alegrias. Ora cultivadas, ora gratuitas, ora forçadas.
Dos amigos, dos amores.
Ah, os amores. Aqueles que te fizeram chegar em qualquer lugar onde você nunca mais vai querer voltar. Ou aqueles outros que te amaram tanto, mas você deixou passar.
O tempo. O olhar no espelho. Os significados.
No fim, toda a dor vira alegria, pois em algum momento a promessa de rir dela acaba se cumprindo.
A tempestade vira calmaria. E o sentimento de imbecilidade é inevitável.
As guerras, mazelas, por sua vez, seguirão existindo. E as dores que as acompanham também.
No fim, tudo é lembrança. Porque não há de haver tempo que a apague.
E quem sabe nesse fim, alguns equívocos possam ser perdoados. Pelo menos por nós mesmos.

Essencialmente por nós mesmos.