Eu tinha 16 (ou quinze), quando
descobri o amor pela primeira vez. Aquele amor que não é só um sentimento, é físico.
Que você sente pontadas no estômago e começa a sentir dores em lugares que a
anatomia humana não explica. Passei a descrever esses lugares como sendo a
alma. Essa, que de fato, nem se sabe se existe. Mas quando descobri o amor, ele
veio cheio de tanta dor que, para não parecer um ser hipocondríaco, assumi a
existência da alma, para que nela fossem depositadas todas aquelas dores.
Aos 25, o amor chegou em mim da
forma mais devastadora. E aquela alma, nesse momento, tomou uma proporção tão
grande, que era só ela que doía. Durante algum tempo, transformei-me em minha
alma, e vagava em dor, um ser sem corpo, porque o corpo era tomado pela alma
que doía.
Nunca vivi o amor sem dor. E,
talvez por isso, depois dos 25, decidi que não queria mais amar. E assim foi,
durante muito tempo. O que amei, foi amado sem graça, sem nuances. Vivi possibilidades
de amor que, na ausência de minha alma, não ousava chamar de amor.
O amor é uma dor, dizia Zé de
Serrania. E, para mim, a dor era a condição sinequanon do ato de amar. O amor,
sem dor, não sobreviveria. E eu, que não queria viver a dor, optei então, por
não mais amar.
Ainda assim, ao som de Vinícius e
Cartolas, Chicos e Caetanos, ouvi em Cazuza a sua definição sobre quem não sabe
amar. Entre uma coisa e outra, guardei na alma a frase que dizia sobre esperar
alguém que coubesse em seus sonhos e preferi bradar sobre os amores que nunca
tive. Como aqueles de Folhetim, que vêm da carne e do desejo e permanecem no
tempo de uma gozada.
Gozo, gozas e te quero fora. Longe
de mim. Longe do meu ninho, do meu espaço, de qualquer faísca que possa acender
em mim a vontade de amar. Vá-te.
Aos 29, uma dessas faíscas cai
onde não percebo, e quando me dou conta, o fogo está tão alto a ponto de eu não
encontrar a saída. Achando que podia controlar o fogo, permito que aquela fagulha
pudesse acender o afago em meu ser. Redescubro minha alma. Redescubro-a somente
a tempo de ter que descobrir também o antídoto que a fizesse parar de arder em
chamas. Porque, posto que é chama, viraram chagas em meu próprio ser.
Sobre amar o outro, passei a me
perguntar que ser era aquele que me tornara, eu mesma, que não se reconhecia
quando amava outrem. Sem nenhuma resposta que me satisfizesse, optei por seguir novamente sem querer amar.
Mas amar não tem a ver com
querer. Com escolher em que momento alguém vai atravessar a rua na sua direção
e fazer vibrar em você algo que você nem se lembrava que existia dentro de si. E
mesmo sua mente dizendo que não quer, aquela alma, vem à tona.E aí, você se esquece que a alma
é o entulho da dor. E não percebe que a dor que está lá é um acúmulo de todas as outras
dores.
E quando o amor me arrebatou novamente, ele chegou nesse entulho de lodo
e de dores em decomposição. E quando a dor batia na alma, que batia no corpo,
eu quis retomar o controle. Eu quis controlar tudo e dizer para a alma que era eu
quem comandava. Essa mesma eu, que seguia esperando alguém que coubesse nos
meus sonhos.
E entre sonhos e dores, entre
amar e não me reconhecer, me reconhecer e não querer amar; entre não deixar que
o amor fosse maior, minha alma bradou para mim mesma mais uma dor. E meu corpo
se redimiu. E tudo se diminui a nada. E mandou o amor ir: vá-te.
Mas com ele, dessa
vez, também fora uma parte de mim. Aquela parte que eu não queria deixar de
ser, mas que agora, só existe fora de mim, em outro ser.
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